1 caso e 1000 achados!

Fev de 2019.

Autor: Klaus Schumacher¹ 

Colaboradores: Ewandro Contardi¹, Vanessa Mizubuti Brito¹, Tainah Desuó Rotta²

Orientador: Patrick Nunes Pereira³

 

Preâmbulo

Neste "Um caso e mil achados" existem, na verdade, 7 diagnósticos que poderão ser dados baseados na história clínica e exames de imagem. O exercício aqui é tentar atingir o máximo de acertos antes de passar para os próximos tópicos.

 

História clínica

ID: Mulher, 29 anos, gestante.

HX: G3A1P1FV0 em acompanhamento no pré-natal especializado por malformação uterina e mau histórico gestacional prévio (há 3 anos teve um aborto espontâneo, por volta de 8 semanas, com curetagem) e há 2 anos teve um parto prematuro com 24 semanas que evoluiu com óbito neonatal aos 24 dias de vida).

Encaminhada para pré-natal de alto risco pelo histórico obstétrico e malformação uterina.

Durante a gestação atual a paciente teve queixa de sangramento vaginal intermitente. A equipe obstétrica optou por acompanhamento e indicou o uso de utrogestan® (progesterona via oral) inicialmente.

Com 15 semanas realizou avaliação clínica no pré-natal e USG transvaginal.

Com 18 semanas foi submetida a exérese do XX (1 diagnóstico) mostrado no exame de ultrassonografia acima.

Com 30 semanas realizou RM para melhor avaliação.

Não há exames laboratoriais relevantes para o caso.

 

As imagens mostradas acima serão revistas com as devidas explicaçõe e serão acompanhadas de legendas que formalmente descreverão os achados mais relevantes.

 

Legenda: USG transvaginal que em (A) evidencia dois colos uterinos (identificados com *) e pólipo distendendo o canal no lado direito (flecha); em (B) é possível ver a proximidade do orifício interno do canal cervical e a placenta (círculo); em (C) foi possível estudar a proximidade da bexiga (circunferência), miométrio (#) e placenta (@).

Legenda: USG transvaginal que em (A) e (B) evidencia pólipo endometrial insinuando-se pelo canal cervical e com fluxo característico ao estudo Doppler. Foi realizado polipectomia na paciente por ser o potencial motivo de sangramento intermitente.

Legenda: RM, cortes axiais, T2 single shot; em (A) observam-se a duplicidade dos colos uterinos. Em (B) e (C) notam-se dark bands intraplacentários (flecha) – achado sugestivo para deposição fibrosa (habitual em pacientes o com mal implantação uterina. Em (C) há grande circulação colateral venosa circunjacente ao corno uterino direito, contiguamente à placenta.

Legenda: RM, cortes coronais, sequência Balance; mostra-se em (A) a presença de 2 cornos uterinos (flechas) sem contato (achado que associado à duplicidade de colo uterino mostrado no slide anterior permite a conclusão de útero didelfo. Também é possível ver vaso tortuoso intraplacentário com flowvoid (*); em (B) novamente é possível ver dois colos uterinos (cabeças de seta).

Legenda: RM, cortes sagitais, T2 single shot; em (A) observa-se feto em apresentação cefálica, com placenta prévia centro total, recobrindo oríficio interno do canal cervical. Em (A), (B) e (C) nota-se placenta com sinal difusamente heterogêneo, com vasos anômalos intraplacentários tortuosos e com calibre aumentado (*) e intensa circulação colateral paracervical, notadamente no espaço vesicouterino, obliterando-o (cabeças de seta).

Legenda: em (A) está em evidência a duplicidade do colo cervical; em (B) produto de histerectomia total, com presença dos dois cornos uterinos – o direito maior (gravídico) e o esquerdo menor. Estes achados confirmam o diagnóstico de útero didelfo, conforme a avaliação pelos métodos de imagem.

Legenda: em (A) hemiútero direito com incisão longitudinal exibindo placenta e cordão umbilical clampeado. A instrumentação de ambos os uterinos mostra elegantemente a sua individualização. Em (B) há detalhamento do recobrimento do orifício cervical interno pela massa placentária.

Legenda: peças fixadas; em (A) corte longitudinal preservando a porção medial da parede anterior do hemiútero direito (1) mostrando massa placentária ao fundo e hemiútero esquerdo (2) de menores dimensões. Em (B) há detalhamento da interface placenta-miométrio, com focos parcialmente caracterizados de invasão do miométrio (flecha) e endométrio preservado adjacente (*).

Legenda: corte histológico em HE, mostrando em (A) vilosidades coriônicas de pequenas dimensões com vasos sanguíneos proeminentes (*); achados que são histologicamente compatíveis com terceiro trimestre gestacional; e fibras musculares lisas do miométrio (#). Também, evidencia-se o acretismo placentário em nível tecidual (retângulo tracejado). Em (B) além destes achados observam-se áreas de decidualização do endométrio (elipse tracejada).

Legenda: corte histológico em HE, mostrando em (A) conteúdo amorfo no interior de interior de vilo coriônico (trombose). 

Agora faremos uma associação entre os diferentes fenótipos que estudamos acima, para que possamos associar as imagens com a antomia patológica.

 

Legenda: triangulação de peça (A), ultrassonografia (B) e ressonância magnética (C); sendo possível em todas as modalidades de exame a identificação da duplicidade do colo uterino.

Legenda: perfeita correlação da malformação Mülleriana (útero didelfo) em (A) com RM, corte coronal, Balance (B).

Legenda: vasos tortuosos e de calibre aumentado na face fetal da placenta.

Legenda: massa placentária heterogênea com vasos tortuosos de permeio que se correlacionam com acretismo placentário; chamados de ‘dark bands’ – é um achado que ‘faz pensar em’. O laudo da patologia foi: “incretismo que invade menos da metade do miométrio”.

Legenda: RM, corte coronal, T2 single shot; mostra correlação perfeita entre segmento de acretismo placentário inferido na ressonância magnética e peça fixada. O laudo da patologia foi: “incretismo que invade menos da metade do miométrio”.

Legenda: correlação entre ressonância magnética (A), ultrassonografia (B) e produto de histerectomia total (C); todos ilustrando a cobertura placentária do orifício cervical interno.

Legenda: RM, corte axial, T2 single shot; (A) mostra alargamento da zona juncional que mediu 10,1 mm; (B) e (C) evidenciam o mesmo alargamento bem caracterizado pelo estudo de imagem. A avaliação da patologia foi: “adenomiose extensa”.

Legenda: correlação entre ressonância magnética e peça; lesão nodular intramural com hipossinal em T2 é visto como nódulo descrito pela patologia como ‘nódulos brancacentos, de contornos bem definidos e consistência firme’.

 

CONCLUSÃO

O presente caso não traz desafios diagnósticos rebuscados pela raridade ou atipia da apresentação morfológica, no entanto, conjuga múltiplas doenças prevalentes (exceto pela malformação uterina) que podem ser vistas pelos métodos de imagem.

O gabarito dos 7 diagnósticos são:

  • Gestação
  • Pólipo endometrial
  • Malformação Mülleriana
  • Leiomioma uterino
  • Adenomiose
  • Placenta prévia (centro-total)
  • Incretismo placentário

 


¹ Médico residente do Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas – FCM / UNICAMP.

² Médico residente do Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Ciências Médicas – FCM / UNICAMP. 

³ Médico Radiologista com doutorado em Saúde da Mulher, assistente do Departamento de Radiologia do Centro de Atenção à Saúde da Mulher (CAISM – FCM / UNICAMP).

. 1 caso e 1000 achados!. Dr.Pixel. Campinas: Dr Pixel, 2019. Disponível em: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/1-caso-e-1000-achados. Acesso em: 24 Abr. 2024