Síndrome de desmielinização osmótica

Set de 2017.

Autor: Klaus Schumacher

                                                                                                                                                                                                                            

Definição

É a morte celular devido a alterações osmolares séricas muito rápidas, incorrendo em desmielinização.

 

O local clássico de acometimento é a região pontina central (em 50% dos casos é o local isolado), em 30% dos casos ocorrem achados pontinos e extrapontinos (gânglios basais e substância branca). Nos outros 20%, a ponte fica intacta.

 

Seu nome antigo era mielinólise pontina central e/ou mielinólise extrapontina.

 

Epidemiologia

É uma síndrome rara. Inicialmente descrita em etilistas (doença hepática crônica) – grupo em que a hiponatremia hipo-osmolar é frequente. Outras condições que predispõe a grande variação de volume-osmolar também aumentam o risco: grandes queimados, desnutrição e transplante hepático.

 

Patologia

Classicamente foi relacionada aos níveis séricos de sódio (Na+). Isto se deve ao fato do sódio ser o determinante de maior importância na osmolaridade sérica efetiva.

 

Há uma sequência de eventos para a ocorrência da SDO:

  1. Hiponatremia hipotônica que pela velocidade de instalação permite uma adaptação neuronal/glial;
  2. Adaptação cerebral pela perda de osmólitos que impede o edema cerebral. Este novo estado adaptado torna o cérebro suscetível às variações rápidas de osmolaridade do meio. A adaptação neuronal/glial leva 2 dias.
  3. Uma rápida correção da hiponatremia hipotônica, induz ao shift extracelular de água;
  4. Desidratação celular, que por mecanismos ainda não muito claros, culmina em desmielinização aguda.

 

Se não houvesse adaptação neuronal/glial à hiponatremia, ocorreria o edema cerebral.

 

Esta sequência de eventos virtualmente só ocorre em pacientes um hiponatremia importante (<120 meq/L), mas depende sumariamente da velocidade de instalação e de correção da natremia. Estão relacionadas à SDO velocidades de correção >12 meq/L em 24 horas e/ou >18 meq/L em 48 horas.

 

Em nível celular os oligodendrócitos são os tipos celulares mais vulneráveis às alterações de osmolalidade. Há tipicamente um processo de desmielinização ativa (fendas e vacuolização), com neurônios viáveis. Macrófagos abundantes contendo debris de mielina degenerada é um achado comum depois de alguns dias. Caracteristicamente, não há reação inflamatória.

 

Apresentação clínica

A manifestação clínica é atrasada em relação à correção natrêmica; demorando de 2-6 dias para aparecer: alterações comportamentais, afasia, disartria, paraparesia, quadriparesia, letargia, obnubilação e coma. Outros inúmeros achados neurológicos podem estar presentes, na dependência do local onde houve o a desmielinização osmótica.

 

O dano neurológico é geralmente irreversível ou, parcialmente, reversível.

 

Diagnóstico

Deve ser suspeito pela história clínica de rápida correção de hiponatremia e confirmado pelo exame de imagem: ressonância magnética (a tomografia computadorizada tem um papel mais limitado).

 

Imagem

A evidência de achados, mesmo na ressonância magnética, pode demorar semanas para aparecer; desta maneira, um exame de imagem negativo não é suficiente para afastar a condição, sendo necessário repeti-lo em algumas semanas. Tipicamente, os 2/3 superior da ponte são acometidos.

 

A SDO extrapontina afeta predominantemente gânglios da base e substância branca. Necrose cortical laminar é uma forma incomum de apresentação.

 

Tomografia computadorizada

Para SDO pontina: hipoatenuação em ponte que não cruza a linha média. Baixa sensibilidade e especificidade pela grande presença de artefatos de endurecimento do feixe de raio-X na fossa cerebelar.

 

Ressonância magnética

As alterações à ressonância magnética são bilaterais, simétricas e bem delimitadas.

 
Na SDO a região central da ponte (principalmente sua base) terá alteração do sinal nas sequências convencionais tardiamente (>1 semana). A difusão é mais sensível, mostrando hiperintensidade nas primeiras 24 horas.

 

Todas essas alterações não ocorrem nas fibras periféricas da ponte (vetrolaterais) ou nos limites subpiais e periventriculares. As fibras transversas também ficam inicialmente preservadas, assim como os tratos corticoespinais.

 

  • T1: Hipo/isossinal.
  • T2/FLAIR: Iso/hipersinal.
  • T2* (SWI): sem sinal de sangramento.
  • T1 +C Gad: realce discreto a moderado.
  • DWI: sequência mais sensível para detecção da SDO. Hiperintensidade ocorre nas primeiras 24 horas, e mantém-se com restrição por ~7 dias.

 

As alterações de T1 e T2 tendem a normalizar em alguns semanas-meses.

 

Sinal clássico descrito em região pontina é a lesão em tridente (que pode ser visto em T2/FLAIR e T1 +C).

Caso de SDO com acometimento pontino e extrapontino (30% dos casos). (A e B) mostram a típica lesão de hiperintensidade em T2/FLAIR (seta vermelha) que poupa fibras periféricas (ventrolaterais), trato córticoespinhal e fibras pontinas transversais (seta branca). (C) o mesmo é visto em T2. (D) o (*) identifica a restrição à difusão das moléculas de água - sinal mais precoce e sensível para o diagnóstico. (E) Realce discreto a moderado ao meio de contraste (seta azul). (F, G e H) lesões de substância branca corticossubcortical e gânglios da base (seta laranja).

 

Caso de SDO em que só houve acometimento pontino (50% dos casos). Em (A) a exemplificação do sinal do tridente; (B) mais uma vez mostra as características de poupar fibras periféricas (setas brancas) e trato córticoespinhal; (C) restrição à difusão com mesmo padrão de distribuição; (D) plano sagital em T1, mostrando a similaridade com gliomas pontinos.

 

Diagnóstico diferencial

- Isquemia/infarto do tronco encefálico – artérias perfurantes basilares (aqui há respeito da linha média, sendo uma alteração assimétrica.

- Doenças desmielinizantes.

- Tumores pontinos (primários – gliomas – ou metástases).

- Doença metaboólica – para os casos apenas extrapontinos (ex.: doença de Wilson).

 

 

 

. Síndrome de desmielinização osmótica. Dr.Pixel. Campinas: Dr Pixel, 2017. Disponível em: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/sindrome-de-desmielinizacao-osmotica. Acesso em: 28 Mar. 2024