Introdução: a epidemia causada pelo vírus Zika ocorrida no Brasil entre os anos de 2015 e 2016 trouxe graves consequências para as crianças nascidas de mães infectadas pelo vírus durante a gestação. A síndrome congênita pelo Zika vírus está associada a diversas malformações e alterações neurológicas e sensoriais, que implicam em prejuízos funcionais para o desenvolvimento neuropsicomotor e de linguagem, incluindo restrições importantes na oralidade. Objetivo: analisar os processos enunciativos de crianças com Síndrome Congênita pelo Zika Vírus e suas principais parceiras na interação dialógica. Método: pesquisa longitudinal de abordagem clínica qualitativa com apoio quantitativo tendo em vista obter uma análise mais aprofundada e robusta da temática em foco. A amostra foi constituída por quatro crianças com suas respectivas mães e uma fisioterapeuta, responsável pelos atendimentos das crianças em sua cidade de origem, totalizando nove participantes, distribuídos em oito díades. Os dados foram coletados em dois momentos, um inaugural e o segundo após o período de um ano. As gravações em vídeo foram realizadas no contexto do brincar e tiveram duração de três minutos cada. Os dados foram transcritos e analisados, primeiramente pelos critérios da análise de conteúdo para o estabelecer as categorias emergentes, foram organizados em tabelas e em seguida passaram pela análise estatística, os dados transcritos, por sua vez, possibilitaram uma análise qualitativa considerando a importância dos achados obtidos. Resultados: revelaram que as principais parceiras de comunicação – mães e fisioterapeuta – utilizam modos enunciativos dirigidos às crianças relevantes para presumir competência, persistir na interação, engajar e interagir, ser flexível e ser paciente proporcionando oportunidades e trocas dialógicas significativas no contexto das interações linguísticas analisadas. O posicionamento corporal da díade também foi um aspecto relevante para os desdobramentos linguísticos ocorridos da situação interativa. As crianças, por sua vez, apresentaram manifestações linguísticas variadas e multimodais, caracterizadas por choro, sorriso, olhar para a parceira, olhar para o referencial, olhar para o ambiente, triangulação do olhar, movimentos corporais, gestos e vocalizações com o intuito de usos sociais da linguagem distintos. Esses usos foram caracterizados como protestar, obter ou pedir algo, solicitar atenção, demonstrar interesse na interação, expressar sentimentos, responder e fazer escolhas. Conclusão: a análise articulada dos resultados permitiu compreender com maior profundidade os desafios linguísticos enfrentados por crianças com SCZ e seus parceiros de comunicação, evidenciando que o sucesso das interações não depende exclusivamente da criança, mas do papel essencial que exercem os parceiros nesse processo dialógico. A pesquisa contribui com subsídios valiosos para a elaboração de ações em Saúde e Educação, em especial para a atuação da fonoaudiologia, que tem papel central na promoção da linguagem, que priorizem a formação de parceiros de comunicação qualificados, capazes de reconhecer a criança como sujeito linguístico.