"A distância que nos une". Evento na FCM aborda as desigualdades brasileiras

Enviado por Camila Delmondes em Tue, 23/01/2018 - 16:09

Ainda no início de dezembro de 2017, a Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp – por intermédio do Departamento de Saúde Coletiva (DSC) e do Centro Colaborador em Análise de Situação de Saúde (CCAS) – recebeu a diretora executiva da Oxfam Brasil, Kátia Drager Maia, para a conferência “A distância que nos Une: um retrato das desigualdades brasileiras". Com 20 organizações confederadas espalhadas pelo mundo, a Oxfam Internacional estabelece uma rede sistemática de atuação em 90 países, propondo soluções para o combate à pobreza e à injustiça.

Na ocasião, a representante da Oxfam no Brasil apresentou dados da concentração de renda e das desigualdades sociais brasileiras constantes do relatório do mesmo título da conferência, publicado em setembro de 2017, e que agora também corroboram os dados do relatório intitulado “Recompensem o trabalho, não a riqueza”, divulgado pela organização no início dessa semana. De acordo com ambos os documentos, o ano passado registrou o maior número de bilionários da história, em número suficiente para acabar com a pobreza extrema global em mais de sete vezes. Enquanto 82% de toda a riqueza gerada, em 2017, ficaram nas mãos de 1% da população mais rica, 50% dos mais pobres ficaram sem nada.

Mesmo em ano de forte retração econômica, o Brasil ofereceu condições para o surgimento de 12 novos bilionários, totalizando 43 personalidades nesse quesito. Entre os bilionários, significativamente, mais ricos, cinco concentraram, em 2017, um patrimônio equivalente à metade de toda a população mais pobre.

“A desigualdade é uma coisa tão profunda na nossa sociedade, mas que de alguma forma se naturalizou. Não se trata de apontar quem tem ‘carro’ e quem não tem ‘carro’, mas sim de chamar a atenção para algo muito mais profundo. No Brasil, um trabalhador que pertence àquela parcela da população que recebe salário mínimo (23%) precisaria trabalhar 19 anos consecutivos para atingir o patamar mensal de uma pessoa alocada no grupo mais rico da população (0,1%)”, explicou Katia.

De acordo com Katia, para combater as desigualdades no Brasil é preciso compreender que elas têm causas estruturais, que envolvem questões como gênero e raça.

 “Apesar das mulheres representarem 51% da população, elas ganham o equivalente a 62% do que ganham os homens. Quando atingimos o patamar de salário mensal acima de 9 mil reais, precisamos de duas mulheres trabalhando para ganhar o mesmo salário desse homem. Quando vamos para raça a situação é muito pior. Os negros ganham, em média 57% menos. Quando analisamos esse mesmo patamar salarial mensal de 9 mil reais, são quatro negros trabalhando pelo salário desse homem branco”, exemplificou.

Leia o relatório na íntegra.

Saúde e desigualdade social

Durante a conferência coordenadora do CCAS, Marilisa Berti de Azevedo Barros, falou sobre a importância dos indicadores de saúde, no contexto de entendimento das desigualdades sociais. “Nossas pesquisas – assentadas diretamente nos serviços de saúde e no campo da saúde pública – permitem a análise e o monitoramento das condições de saúde, observando as transformações que vão ocorrendo ao longo do tempo, em relação a múltiplas dimensões, como os comportamentos de saúde, as doenças, a Atenção à Saúde. Elas também permitem acompanhar o tamanho da desigualdade social que se expressa nos indicadores de saúde”, afirmou Marilisa.

Para o chefe da Saúde Coletiva da FCM, Flávio César de Sá, o entendimento mais aprofundamento de questões como a desigualdade social é fundamental para a compreensão de problemas recentes que afetam a população brasileira em diversos segmentos, dentre os quais, o segmento de saúde.

“Nesse momento, temos atravessado uma dificuldade enorme de compreensão de questões estruturais. Temos observado, em diversos setores, uma série de retrocessos nos ganhos sociais e, pela dificuldade de aprofundar algumas questões, nos deparamos com análises superficiais, que não alcançam a raiz dos problemas”.

Reagir para obter melhores resultados foi o caminho apontado por Flávio para a superação dos problemas sociais que afligem a população brasileira. Nesse cenário, a Academia exerce um papel fundamental.

“Não podemos só ficar reclamando. Precisamos transformar essa nossa insatisfação em alguma coisa mais positiva. Apesar de tudo, acredito que nós brasileiros temos essa capacidade de colocar o país para frente. Nós que estamos na universidade, que supostamente fazemos parte de uma elite intelectual, temos o dever e a obrigação moral e ética de aprofundarmos em algumas questões e oferecer propostas consistentes e concretas para que o país avance”, disse Flávio.