Adolescentes de Campinas consomem fibras abaixo do recomendado e parte delas provém de alimentos industrializados
Uma pesquisa de mestrado da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, defendida em março deste ano, analisou a ingestão de fibras alimentares por 891 adolescentes do município de Campinas. Verificou-se que, além do consumo estar abaixo da quantidade recomendada, 25% das fibras ingeridas são provenientes de alimentos ultraprocessados, como pães de pacote, achocolatados e biscoitos.
“A indústria alimentícia adiciona fibras alimentares aos alimentos ultraprocessados para atuarem como estabilizantes e espessantes. No entanto, tais alimentos não podem ser considerados saudáveis. As fibras da alimentação devem ser provenientes de alimentos in natura. Essa é a base de uma dieta saudável”, alerta a nutricionista Rafaela de Campos Felippe Meira, responsável pelo estudo de base populacional, realizado sob a orientação da pesquisadora Daniela de Assumpção. Os dados para a pesquisa são do Inquérito de Consumo Alimentar e Estado Nutricional (ISACamp-Nutri).
De acordo com a pesquisa, os adolescentes campineiros apresentaram consumo de fibras alimentares inferior à média atualmente recomendada pelo Ministério da Saúde. Da quantidade ideal de 12,5g a cada 1.000 calorias, eles ingeriram apenas 6,4g, ficando, ainda, abaixo da média nacional, de 7,6g.
Do total das fibras ingeridas pelos adolescentes de Campinas, 4,9g representavam a porção de fibras insolúveis, e 1,5g para as fibras solúveis. As meninas apresentaram maior ingestão de fibra alimentar total e solúvel. Já os adolescentes com melhor nível socioeconômico apresentaram melhores índices de ingestão de fibra solúvel.
Segundo explica Rafaela, as fibras alimentares estão presentes em alimentos como frutas, hortaliças (cruas e cozidas), leguminosas (feijão, grão de bico, lentilha, ervilha), cereais, especialmente os integrais (arroz, farelo de trigo, aveia), raízes e tubérculos (mandioca, batata doce, batata baroa, cenoura) e oleaginosas (castanhas). E são classificadas em dois grupos, as solúveis e as insolúveis, por desempenharem funções diferentes no organismo.
As fibras solúveis absorvem água formando géis viscosos, que contribuem para a redução dos níveis sanguíneos de colesterol e para o melhor controle da glicemia. Já as fibras insolúveis não absorvem água, retardam o esvaziamento gástrico, promovendo maior saciedade e contribuindo para o bom funcionamento intestinal.
“É preciso ficar atento em relação ao tipo de alimento ingerido. O consumo adequado de fibras alimentares previne o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, de câncer em diversas localizações, de obesidade e diabetes; as fibras são fundamentais para o tratamento da diabetes, evitando episódios de hipoglicemia ou hiperglicemia”.
A pesquisa também verificou que os adolescentes que não realizavam o café da manhã diariamente, que não costumavam verificar os rótulos dos alimentos e que autoavaliaram a qualidade da dieta como ruim e muito ruim tiveram médias inferiores de fibras alimentares.
Os alimentos ultraprocessados contribuíram com 24,8% das fibras alimentares ingeridas pelos adolescentes, sendo os biscoitos, os pães de pacote e achocolatados os principais alimentos dessa categoria. “Verificamos que 37,9% do teor de fibras solúveis e 21,0% das fibras insolúveis ingeridas eram provenientes de produtos ultraprocessados, porém, essa é uma situação preocupante. Esses alimentos contêm uma quantidade excessiva de açúcar, sal e gorduras ruins e, naturalmente, são pobres em fibras alimentares”, alerta Rafaela.
A queda no consumo de cereais, leguminosas e raízes e tubérculos a partir da década de 1970, com gradativo aumento do consumo de produtos alimentícios ultraprocessados como biscoitos, doces e salgados, salgadinhos de pacote e achocolatado, ajuda na compreensão dos dados obtidos em relação à ingestão de fibras alimentares pelos jovens brasileiros, de modo geral, explica Rafaela.
“Precisamos reverter essa situação, incentivando o consumo de frutas, hortaliças, cereais e tubérculos. São necessárias ações de promoção do consumo de alimentos in natura ou minimamente processados, além de medidas regulatórias, a exemplo da taxação dos produtos ultraprocessados e de subsídios aos alimentos saudáveis”, conclui a pesquisadora.