Introdução:
O câncer de ovário é a neoplasia ginecológica de maior letalidade, sendo o estádio da doença ao diagnóstico um dos principais determinantes de sobrevida. Embora a ultrassonografia (US) seja a principal ferramenta na avaliação de massas anexiais, a tomografia computadorizada (TC) exerce papel essencial no estadiamento e no planejamento cirúrgico. A sarcopenia — perda de massa muscular esquelética — tem sido identificada como fator prognóstico em oncologia, inclusive no câncer de ovário. A TC permite a avaliação da composição corporal sem necessidade de exames adicionais, mas sua técnica e utilidade diagnóstica e prognóstica em pacientes com massas anexiais ainda são pouco conhecidas.
Objetivo:
Avaliar a viabilidade, a reprodutibilidade e o valor clínico da análise de sarcopenia por TC utilizando um software de código aberto em pacientes com massas anexiais classificadas como indeterminadas ou malignas por modelos ultrassonográficos.
Como objetivo secundário, investigou-se a associação entre sarcopenia e o diagnóstico anatomopatológico da massa anexial, o estádio tumoral, a presença de carcinomatose peritoneal, a linfonodomegalia, a invasão de estruturas adjacentes e a suspeita de outro sítio primário.
Métodos:
Estudo piloto prospectivo com 38 mulheres portadoras de massas anexiais suspeitas de malignidade conforme avaliação ultrassonográfica realizada no Hospital da Mulher Professor Doutor José Aristodemo Pinotti. Imagens tomográficas axiais não contrastadas no nível da terceira vértebra lombar (L3) foram segmentadas manualmente no software 3D Slicer. O índice de massa muscular esquelética (SMI) foi calculado pela razão entre a área muscular (cm²) e a altura da paciente ao quadrado (m²), considerando-se sarcopenia quando SMI < 38,5 cm²/m². A concordância interobservador foi avaliada por meio de gráficos de Bland- Altman e pelo coeficiente kappa de Cohen. A associação entre sarcopenia e os desfechos clínicos foi testada com o teste do qui-quadrado. A acurácia diagnóstica para predição de malignidade foi quantificada por meio de sensibilidade, especificidade, valores preditivos, razões de verossimilhança e área sob a curva ROC (AUC).
Resultados:
A avaliação da sarcopenia mostrou-se viável e reprodutível, com excelente concordância entre observadores (κ = 0,839). Observou-se associação significativa da sarcopenia com estádio avançado do tumor (p = 0,028), com a presença de carcinomatose peritoneal (p = 0,033). Entretanto, não houve associação com malignidade histopatológica (p = 0,640), linfonodomegalia (p = 0,47), invasão de estruturas adjacentes (p = 0,80) ou suspeita de outro sítio primário (p = 0,11). O desempenho diagnóstico da sarcopenia para predição de malignidade foi limitado (sensibilidade: 42,9 ; especificidade: 64,7 ; AUC: 0,538).
Conclusão:
A análise de sarcopenia por TC com uso de software de código aberto demonstrou ser factível e reprodutível na prática clínica. Embora associada à doença em estádio avançado, a sarcopenia calculada por esse método na população avaliada não contribui para a predição de malignidade em massas anexiais suspeitas por ultrassonografia. Esses achados reforçam o papel central da US na estratificação
diagnóstica e posicionam a TC como ferramenta complementar para o estadiamento e o planejamento cirúrgico.