Introdução: O câncer de mama permanece como a neoplasia maligna mais prevalente entre as mulheres e uma das principais causas de morte por câncer, especialmente em países onde a cobertura de rastreamento é limitada e o diagnóstico frequentemente ocorre em estágios avançados. Embora o tratamento cirúrgico seja pilar fundamental no manejo, a extensão da ressecção e a forma de detecção tumoral podem influenciar indiretamente os desfechos por meio da associação com o estadiamento e as características biológicas do tumor. Este estudo teve como objetivo avaliar, de forma integrada, como o tipo de cirurgia oncológica (conservadora com ou sem oncoplastia e mastectomia com ou sem reconstrução imediata) e a maneira do diagnóstico (clínico versus rastreamento) se relacionam aos desfechos de sobrevida em pacientes com câncer de mama invasivo, além de estimar os anos de vida perdidos (AVP) e os anos de vida doença-livre perdidos (AVDLP) segundo o estadiamento clínico. Métodos: Foi conduzido um estudo de coorte retrospectiva incluindo 1.517 mulheres com câncer de mama invasivo unilateral e não metastático, submetidas à cirurgia entre 2012 e 2016 em um hospital universitário terciário no Brasil, com tempo médio de seguimento de 5,9 anos. Foram analisados dados clínicos, patológicos e terapêuticos. As sobrevidas global (SG), livre de doença (SLD) e câncer-específica (SCE) foram estimadas pelos métodos de Kaplan–Meier e regressão de Cox. AVP e AVDLP foram calculados conforme o estadiamento clínico, a partir das perdas em relação à expectativa de vida e ao tempo projetado livre de recorrência. Resultados: Foram incluídas 1.517 pacientes com câncer de mama invasivo unilateral e não metastático, com tempo médio de seguimento de 5,9 anos. A maioria foi submetida à cirurgia conservadora (53,2 ), seguida por mastectomia (29,3 ), mastectomia com reconstrução imediata (17,5 ) e oncoplastia (6,9 ). Embora as análises univariadas tenham mostrado pior sobrevida após mastectomia e SLD discretamente inferior após oncoplastia, essas diferenças não se mantiveram após o ajuste multivariado. Idade, tamanho tumoral, comprometimento linfonodal, grau histológico, invasão linfovascular e subtipo molecular foram os fatores independentemente associados à sobrevida. A recorrência local ocorreu em 4,2 dos casos, sem diferença entre as técnicas cirúrgicas. Em relação ao modo de detecção, 69,5 das pacientes foram diagnosticadas a partir de sinais e sintomas clínicos, principalmente tumores palpáveis, enquanto 30,5 foram diagnosticadas por rastreamento. As pacientes sintomáticas eram mais jovens e apresentavam tumores em estágios mais avançados, de maior grau histológico, com invasão linfovascular e subtipos mais agressivos (HER2+ e triplo negativo). Esse grupo foi mais frequentemente submetido à mastectomia e à quimioterapia neoadjuvante. Na análise univariada, o diagnóstico clínico esteve associado a piores taxas de SG (81,1 vs. 92,1 ), SLD (77,8 vs. 89,5 ) e SCE (86,1 vs. 95,3 ); contudo, essa associação não se manteve após ajuste multivariado, sendo o estadiamento e a biologia tumoral os principais determinantes prognósticos. A análise dos AVP e AVDLP demonstrou aumento progressivo das perdas conforme o avanço do estadiamento, refletindo maior comprometimento da longevidade e do tempo de vida saudável nos estágios mais avançados. Conclusões: Nesta ampla coorte brasileira, os desfechos de sobrevida foram determinados principalmente pelo estadiamento e pelas características biológicas dos tumores, e não pelo tipo de cirurgia ou pelo modo de detecção. A cirurgia conservadora, com ou sem técnicas oncoplásticas, demonstrou segurança oncológica equivalente à mastectomia. A análise de AVP e AVDLP por estadiamento evidencia o impacto do diagnóstico tardio sobre a sobrevida e o tempo de vida saudável em um centro terciário especializado em saúde da mulher.